quinta-feira, 24 de maio de 2012

Mais um!

Mais um post do "Meus Guris", de 9 de agosto de 2011. Texto do Frei Betto, material de aula da disciplina Corpo & Movimento aplicada no 4º período da faculdade.

De COTIDIANO & MISTÉRIO (Olho D’Água):




O processo educacional abarca, numa concepção totalizante, quatro dimensões: transmissão do patrimônio cultural, despertar das potencialidades espirituais, reflexão do que se vive e capacidade de modificar a realidade. Hoje, a escola restringe-se à primeira dimensão. O acesso ao saber justifica-se por razões de ordem instrumental. Alijado da criatividade e da reflexão, transforma-se em processo de domesticação intelectual. Basta conferir os livros didáticos que já vêm com respostas às questões levantadas, como se fossem universais, neutras, sem implicações ideológicas. Daí a perplexidade quando a resposta do educando não coincide com a da editora ou a do autor. Não se admite que uma mesma questão possa ter diferentes soluções. Assim, a aprendizagem confina-se na memorização, com a mera reprodução do saber.
Filha da tradição cartesiana, a escola só se preocupa com a pessoa do pescoço para cima. Desconsidera pois o vasto leque de potencialidades não estritamente intelectuais, mas lúdicas, artísticas e espirituais, que não podem ser trabalhadas ao nível dos conceitos. Acentua-se a divisão entre o saber intelectual e o experimental. A escola, ao separar o espaço do aprendizado do espaço da existência, impede o sujeito de pensar o cotidiano com suas implicações. Essas aparecem fragmentadas, como se o assalto a banco não tivesse nenhuma relação com a política salarial ou as medalhas de ouro conquistadas numa Olimpíada com o investimento na área social.
Questões fundamentais são ignoradas pela escola, como a relação do educando com doenças, fracassos, frustrações, medos e mortes. Diante das situações-limites da vida reina o silêncio. Educa-se para a competitividade e o sucesso e não para tecer laços de solidariedade que amenizem situações conflitivas. Em suma, falta à escola abordar o sentido da existência.

Frei Betto, frade dominicano e escritor.

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